A matemática da vida em Fukushima
Há no Japão um grupo de 200 aposentados, em sua maioria engenheiros,
que se oferece para substituir trabalhadores mais jovens num perigoso
trabalho: a manutenção da usina nuclear de Fukushima, que foi
seriamente afetada pelo grande terremoto de três meses atrás. Os
reparos envolvem altos níveis de radioatividade cancerígena.
Em entrevista à BBC, o voluntário Yasuteru Yamada, que tem 72 anos e
negocia com o reticente governo japonês e a companhia, usa uma lógica
tão simples quanto assombrosa.
"Em média, devo viver mais uns 15 anos. Já um câncer vindo da radiação
levaria de 20 a 30 anos para surgir. Logo, nós que somos mais velhos
temos menos risco de desenvolver câncer", afirma Yamada.
É arrepiante. Na contramão do individualismo atual - e lidando de uma
maneira absolutamente realista em relação à vida e à morte -,
sexagenários e septuagenários querem dar uma última contribuição: ser
úteis em seus últimos anos e permitir que alguns jovens possam chegar
às idades deles com saúde e disposição semelhantes.
O que mais impressiona em toda a história é a matemática da vida. A
morte não é para eles um problema a ser solucionado - ou talvez
corrigido, pela hipótese mística da vida eterna que medicina e
biologia tentam encampar e da qual as revistas de boa saúde tentam nos
convencer; a morte é, de fato, a constante da equação.
Nada que o mundo ocidental não conheça. O filósofo alemão Georg
Friedrich Hegel (1770-1831) certa vez definiu "mestre" como alguém
desapegado da vida a ponto de enfrentar a morte, enquanto "servo"
seria um escravo do desejo de continuar vivo - e que obedeceria mais
às regras que lhe garantissem a sobrevida. Em consequência, o servo
anula sua vontade de transformar o mundo e a si mesmo.
Criados numa sociedade de consumo, corremos o risco de levar essa
escravidão às últimas, defendendo a boa saúde e os confortos com muito
mais afinco do que aquilo que podemos fazer por nós e pelos outros
enquanto ainda gozamos dela.
Os senhores do Japão ensinam que a morte é a hora em que podemos
continuar a existir na memória das pessoas - uma oportunidade que,
para mim, eles não perdem mais.
Há no Japão um grupo de 200 aposentados, em sua maioria engenheiros,
que se oferece para substituir trabalhadores mais jovens num perigoso
trabalho: a manutenção da usina nuclear de Fukushima, que foi
seriamente afetada pelo grande terremoto de três meses atrás. Os
reparos envolvem altos níveis de radioatividade cancerígena.
Em entrevista à BBC, o voluntário Yasuteru Yamada, que tem 72 anos e
negocia com o reticente governo japonês e a companhia, usa uma lógica
tão simples quanto assombrosa.
"Em média, devo viver mais uns 15 anos. Já um câncer vindo da radiação
levaria de 20 a 30 anos para surgir. Logo, nós que somos mais velhos
temos menos risco de desenvolver câncer", afirma Yamada.
É arrepiante. Na contramão do individualismo atual - e lidando de uma
maneira absolutamente realista em relação à vida e à morte -,
sexagenários e septuagenários querem dar uma última contribuição: ser
úteis em seus últimos anos e permitir que alguns jovens possam chegar
às idades deles com saúde e disposição semelhantes.
O que mais impressiona em toda a história é a matemática da vida. A
morte não é para eles um problema a ser solucionado - ou talvez
corrigido, pela hipótese mística da vida eterna que medicina e
biologia tentam encampar e da qual as revistas de boa saúde tentam nos
convencer; a morte é, de fato, a constante da equação.
Nada que o mundo ocidental não conheça. O filósofo alemão Georg
Friedrich Hegel (1770-1831) certa vez definiu "mestre" como alguém
desapegado da vida a ponto de enfrentar a morte, enquanto "servo"
seria um escravo do desejo de continuar vivo - e que obedeceria mais
às regras que lhe garantissem a sobrevida. Em consequência, o servo
anula sua vontade de transformar o mundo e a si mesmo.
Criados numa sociedade de consumo, corremos o risco de levar essa
escravidão às últimas, defendendo a boa saúde e os confortos com muito
mais afinco do que aquilo que podemos fazer por nós e pelos outros
enquanto ainda gozamos dela.
Os senhores do Japão ensinam que a morte é a hora em que podemos
continuar a existir na memória das pessoas - uma oportunidade que,
para mim, eles não perdem mais.
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